Preconceito Espiritual: Porque Ainda Temos Medo do Invisível?
Nostalgia e medo
Há em nós uma estranha nostalgia pelo mistério e, ao mesmo tempo, um medo atávico dele.
Desde as cavernas até os laboratórios modernos, o ser humano aprendeu a acender tochas — primeiro para espantar as feras, depois para iluminar a ignorância. Mas quanto mais luz acendemos fora, mais sombra criamos dentro.
O invisível, essa dimensão que não se mede nem se pesa, tornou-se o novo inimigo da razão.
Acreditamos que só o que se vê é real, e que tudo o que escapa aos olhos é superstição, ilusão ou ameaça.
Contudo, o invisível não deixou de existir — apenas se retirou, silencioso, para dentro de nós.
O medo herdado
Platão dizia que “o mundo visível é apenas uma sombra do mundo das ideias”.
Hoje, a maioria vive como se fosse o contrário: sombras que acreditam ser a única realidade.
Desaprendemos a olhar para dentro.
O espiritual tornou-se motivo de piada, o sagrado virou espetáculo, e o invisível — esse campo fértil da alma — foi reduzido a farsa ou charlatanismo.
Mas o preconceito espiritual não nasce da razão.
Ele nasce do medo: medo de sentir o que não se explica, medo de entregar o controlo, medo de se reconhecer parte de algo maior.
É o medo do abismo que somos.
O século da descrença
Vivemos um tempo curioso: proclamamos liberdade de pensamento, mas tememos tudo o que não cabe no pensamento lógico.
O materialismo travestiu-se de inteligência, e a fé foi exilada da filosofia como se fosse sua inimiga.
Diria que é o preço da modernidade: a arrogância de crer que o humano basta a si mesmo.
Mas, como lembrava Pessoa, “tudo quanto vive é invisível na sua raiz”.
A poesia, a arte, o amor, o espanto — todas essas coisas que realmente nos fazem humanos — vêm do invisível.
Negá-lo é amputar metade da nossa existência.
O retorno do Sagrado
O sagrado não desapareceu; apenas mudou de roupa.
Hoje, ele se manifesta na busca por sentido, nas terapias que tocam o invisível, nas preces silenciosas dos que já não acreditam em religião, mas ainda acreditam no mistério.
O sagrado renasce cada vez que alguém olha o céu e sente um arrepio.
Cada vez que alguém chora sem saber porquê.
Cada vez que uma alma compreende que viver é mais do que sobreviver.
Desmistificar o invisível não é destruí-lo — é reconciliar-se com ele.
É aceitar que a razão ilumina o caminho, mas não o destino.
É entender que o invisível não é inimigo da ciência, mas o seu horizonte.

O preconceito que nos separa
Temos preconceito contra o invisível porque ele não se deixa dominar.
Não obedece a sistemas, não se mede em gráficos, não se vende em mercados.
O invisível é subversivo — ele devolve o poder ao indivíduo e recorda que a verdade está em cada ser, não em nenhuma autoridade.
É mais fácil zombar do que mergulhar.
Mais simples negar o mistério do que permitir que ele nos transforme.
Mas o preço dessa negação é o vazio — um mundo cheio de dados, mas sem sentido; de ruído, mas sem voz interior.
O Reencontro
O invisível não é o contrário do real. É o seu coração.
Quando o preconceito espiritual ceder, veremos que não há guerra entre fé e razão, entre ciência e alma — há apenas camadas diferentes do mesmo universo a tentar compreender-se.
Platão chamaria isso de anamnesis — a lembrança do que já sabemos, mas esquecemos.
Pessoa chamaria de o regresso à casa do ser.
E talvez eu diga, com alguma ironia lúcida, que talvez tenhamos passado séculos a estudar o mundo para, enfim, descobrir que o invisível sempre foi o mais visível de tudo.
O medo do invisível é o medo de nós mesmos.
Enquanto o cultivarmos, permaneceremos prisioneiros da superfície, vagando num mundo sem alma.
Mas quando ousarmos atravessar a sombra e olhar com os olhos do espírito, veremos que não há nada a temer.
O invisível não é o escuro — é apenas a parte do mundo que ainda não tivemos coragem de amar.
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